História dos tempos em que havia grandes tribunos políticos, contada pelo Gaudêncio Torquato em suas Porandubas Políticas:
"Tancredo Neves era promotor em São João Del Rey, em Minas.
Um homem chamado Jesus matou uma mulher chamada Madalena. Tancredo pediu 22 anos de cadeia para Jesus, o júri deu 18, Jesus foi para a cadeia, Tancredo esqueceu.
O tempo passou. Nove anos depois, Tancredo advogado, vai a Andrelândia, pequena cidade próxima a São João Del Rey. De barba por fazer, entra em modesta barbearia de canto de rua, senta-se, está cansado, fecha os olhos, o barbeiro pega a navalha, afia, começa a tirar-lhe a barba, puxa conversa :
— O senhor é o Dr. Tancredo Neves, né ?
Tancredo abre os olhos, reconhece Jesus, o assassino de São João Del Rey. Espia pelo canto do olho, a barbearia vazia, a rua vazia, não chegava ninguém, não passava ninguém, o suor minava aflito na testa molhada e Jesus com a navalha enorme na mão pesada correndo garganta abaixo, sobe-desce, sobe-desce, abrindo caminhos na espuma.
Jesus ficou só espiando. Tancredo só teve voz para dizer:
— Sou, sim.
— Pois é, Dr. Tancredo, a vida.
— Pois é, Jesus, a vida.
— Cumpri nove anos dos 18, estou aqui, o senhor aí, o senhor com sua barba, eu com minha navalha. Só queria lhe dizer uma coisa, Dr. Tancredo.
Tancredo suava, Jesus corria a navalha pelo pescoço :
— Que coisa bonita é um júri, hein, Dr. Tancredo? Que coisa mais bonita, que discursos bonitos que o senhor e o outro doutor fizeram!"
"No coração da gente". O slogan de campanha usado por André Puccinelli (PMDB) ao disputar a cadeira de prefeito de Campo Grande, que ocupou por oito anos e de onde se projetou para virar governador de Mato Grosso do Sul também por dois mandatos, é bastante conhecido na cidade. Mas quem afinal criou o símbolo do coração de suas campanhas? Não é obra de nenhum marqueteiro e, embora tenha sido novidade para os eleitores da Capital daquela época, o coração usado por André já era coisa antiga.
Foi a marca de sua primeira campanha quando disputou em 1982 a prefeitura da pequena cidade de Fátima do Sul, seu berço político e de outras conhecidas lideranças do estado como o deputado Londres Machado (PR). Lá de Fátima, o professor Wagner Cordeiro Chagas, nosso colaborador, revela: a ideia de usar o coração como símbolo foi de Nilton Giraldelli, ex-vereador que em 1988 disputou a cadeira de prefeito de Fátima com seu amigo André de vice na chapa. Em e-mail enviado ao professor, Giraldelli relembrou a história:
– "Estávamos reunidos em umas trinta pessoas na edícula do fundo da casa do André na rua Severino Araújo Ferreira e discutíamos a necessidade de criar um símbolo. Diante de várias sugestões, eu disse: ´Estamos colocando nosso coração, muito ideal e muita garra nessa campanha. Além do mais o André é médico, cirurgião geral e se precisar operar um coração ele opera`. Então, a ideia do coração se materializou. O André mandou fazer todo o material de campanha com o símbolo do coração, que perdura até hoje".
Na época, cada partido poderia lançar até três candidatos à prefeitura pela sublegenda. Em Fátima do Sul, o PDS lançou dois: o médico Hermindo de David, apoiado pelo grupo do deputado Londres Machado, e Danilo Alves Corrêa, irmão do então deputado estadual Manfredo Corrêa, com apoio do atual prefeito Samir Chafic Garib. O PMDB lançou Puccinelli e Alcides Rodrigues, este representando o distrito de Vicentina.
A disputa foi acirrada. Logo em sua eleição de estreia, André foi o mais votado. Obteve 6.320 votos, e Alcides obteve obteve 394, somando 6.714. Porém, Hermindo se elegeu prefeito com 4.047 votos que somados aos 2.732 de Danilo totalizaram 6.779 na legenda, só 65 a mais do que o total obtido por André e Alcides.
Brotava ali uma histórica rivalidade política entre o agora ex-governador André, que acaba de concluir seu segundo mandato, e o ex-deputado Londres, que se aposentou das disputas eleitorais e acaba de encerrar em 2014 seu décimo-primeiro mandato consecutivo na Assembleia, um recorde mundial.
Depois da eleição, Wilson Martins (PMDB), que se tornou naquele ano o primeiro governador eleito de Mato Grosso do Sul, nomeou o médico Puccinelli como secretário estadual de Saúde, dando início a sua carreira política em Campo Grande.
Acima, a imagem de um histórico "santinho" da primeira campanha eleitoral de Puccinelli, reproduzida do arquivo André Honorato, morador de Vicentina, que foi candidato a uma cadeira de vereador em Fátima naquele ano. A imagem nos foi enviada pelo professor Wagner Cordeiro de Chagas para a seção Garimpando História do Blog.